Imagine a cena: você vê uma propaganda de uma marca de automóvel dizendo que “só amanhã, taxa de juros de 0% em nosso modelo X”!
Você fica empolgado. Afinal, não importa em que data você esteja lendo esse artigo, os juros de financiamentos no Brasil normalmente são bem altos. Então talvez valha a pena dar uma conferida.
No dia seguinte, você vai até uma concessionária da marca. Olha o modelo, acha interessante, vê o preço (R$ 50.000,00) e tudo parece ok.
O vendedor lhe explica que, para alcançar essa taxa de juros, você precisa pagar R$ 25.000,00 à vista e parcelar R$ 25.000,00 em 12 meses.
Não parece ser tão ruim. Uma parcela de R$ 2.083,00 (25.000,00 / 12) cabe meio apertado no orçamento, mas é pagável se algumas contas forem ajustadas em casa.
Mas então o vendedor apresenta o valor da parcela:
R$ 2.183,90
Você não entende. Faz as contas (2.183,90 x 12 = 26.206,80) e fica mais perplexo ainda. Se a taxa de juros era 0%, o total financiado não deveria ser R$ 25.000,00?
Quando se trata de financiamentos, todo cuidado é pouco.
Quando uma financiadora oferece uma taxa de juros, ela só está precificando isso, os juros.
O juro é uma taxa que a financiadora cobra para emprestar o dinheiro. É literalmente o preço do dinheiro entregue a você.
Mas não é somente disso se compõe um financiamento. Em um financiamento de automóveis, por exemplo, o financiamento inclui:
Por mais que o governo se esforce para coibir abusos na cobrança de taxas administrativas, nenhum financiamento está livre deles.
Além disso, existe o IOF para financiamentos de bens de consumo, que encarece bastante o valor financiado. Desde janeiro de 2015, o IOF para financiamentos de até 12 meses é de 3%, e para financiamentos a partir de 12 meses, o IOF fica em 1,5%. Isso acrescido de mais 0,38% de IOF base.
Voltando no exemplo do carro, a conta que as concessionárias normalmente fazem é a seguinte:
Ou seja, você não está financiando só o carro, mas também diversas taxas, impostos e impostos sobre as taxas. Mesmo com taxa de juros de 0%, você irá pagar mais do que o valor financiado.
Existe uma ferramenta que você pode usar para verificar a “taxa de juros real” de um financiamento.
Chama-se Custo Efetivo Total, ou CET. O CET é o taxa real de acréscimo de valor pago em um financiamento, em relação ao valor financiado. Ele inclui todas as taxas e impostos envolvidas no financiamento.
Ele é dado em duas formas: no valor total, ele indica quanto a mais você está pagando em um financiamento. Por exemplo, se em um financiamento o seu CET aparecer como 200%, quer dizer que você está pagando 2 vezes mais o valor financiado.
Na outra forma, o CET aparece como uma taxa mensal. Ela informa qual seria uma “taxa de juros virtual” do seu financiamento, se você estivesse financiando apenas o bem, e não os impostos e taxas extras.
Com a CET mensal, é possível comparar com a taxa de juros nominal (informado pelo banco), e descobrir o quanto o banco está “mentindo”.
Para ser justo, o banco não está mentindo sobre a taxa de juros. O valor que ele vai receber sobre o empréstimo é realmente o correspondente pela taxa de juros que ele informou. No entanto, é dever do anunciante (no caso, a marca do automóvel) indicar todos os custos que entram no financiamento do bem. Isso é tão importante que o demonstrativo do CET como taxa de juros percentual é obrigatório em todas as operações de crédito desde 2008.
Para calcular o valor do CET como valor total, a conta é muito simples. Você vai precisar de:
A conta é a seguinte:
CET = (valor da prestação x quantidade de prestações) / valor financiado x 100
No nosso exemplo anterior, o Custo Efetivo Total é o seguinte:
CET = (2183,90 x 12) / 25000 x 100 = 26206,80 / 25000 x 100 = 104,8%
Portanto, no financiamento daquele carro você pagaria aproximadamente 5% a mais do que o valor financiado (certamente, não é 0%).
A conta para o Custo Efetivo como taxa de juros real é um pouco mais complicada, e você vai precisar de uma calculadora ou de uma planilha eletrônica para encontrar o valor.
Recomendamos que você use nossa calculadora de Custo Efetivo Total, que calcula todas a taxa de juros real a partir do valor das parcelas do seu financiamento.
Usando o Excel, por exemplo, a fórmula para encontrar a taxa de juros, dado o valor financiado, o número de parcelas e o valor da parcela é:
=TAXA(número de parcelas;valor da parcela;valor financiado)
No exemplo do carro, a taxa mensal efetiva é de 0,73% ao mês. Isso é muito, muito maior do que os 0% anunciados. É por isso que você deve estar atento ao valor do CET.
Financiamentos feitos em bancos diferentes podem oferecer CET diferentes, mesmo que informem taxas de juros iguais. Isso se deve a taxas diferentes exercidas pelos bancos.
Financiamentos feitos dentro do mesmo banco podem dar CET diferentes, mesmo com taxas de juros iguais. Isso pode acontecer principalmente se houver diferenças na quantidade de pagamentos ou valor de entrada.
Veja por exemplo alguns exemplos de financiamento de um carro que simulei em alguns bancos:
Banco | Entrada | Financiado | Valor da Parcela | Total Parcelado | CET Total | CET Mensal | Juros Nominal |
---|---|---|---|---|---|---|---|
A | R$ 15.000,00 | R$ 31.664,00 | R$ 1.656,04 | R$ 39.744,96 | 125,52% | 1,90% | 1,45% |
A | R$ 25.000,00 | R$ 21.664,00 | R$ 1.150,44 | R$ 27.610,56 | 127,45% | 2,04% | 1,45% |
B | R$ 15.000,00 | R$ 31.664,00 | R$ 1.669,35 | R$ 40.064,40 | 126,53% | 1,97% | 1,45% |
Como você pode ver, o CET normalmente passa longe da taxa de juros nominal anunciada pelo banco. No exemplo acima, mesmo com a taxa declarada pelo banco de 1,45% ao mês, as taxas efetivas variaram bem acima disso.
A coisa mais importante que você precisa fazer é não fechar negócio com base somente nos taxa de juros anunciada. E também esteja disposto a fazer bastante pesquisa de preço.
Peça para o vendedor simular o financiamento com todas as taxas e passar para você o valor da parcela.
Anote os valores das parcelas, do montante financiado e o número de parcelas. A seguir, calcule o CET do financiamento e compare com outros financiamentos. Verifique o CET total, para ver o quanto você está pagando a mais pelo bem. O CET total mais baixo, para o mesmo valor financiado e número de prestações, é o melhor.
Peça ao vendedor as taxas embutidas. IOF, taxa de abertura de crédito, gravame, taxa de manutenção, taxa de cadastro, taxa administrativa, etc.
Se durante a pesquisa de preços, conseguir um lugar que tenha taxas administrativas menores, argumente com o vendedor. Mostre que você é um comprador informado e que sabe o que está pagando. Peça para reduzir eventuais taxas administrativas. Essas taxas entram no cálculo do IOF, acrescendo ainda mais o valor da parcela.
Uma dica muito interessante que você pode usar, se tiver condições, é pagar as taxas administrativas e IOF à vista. Fazendo isso, você elimina esses valores do financiamento, reduzindo consideravelmente o valor da parcela. Verifique com o vendedor a possibilidade de se fazer isso.
Esteja atento a todas as taxas. O CET é uma forma bastante eficiente para detectas abusos em taxas, e você deve utilizá-lo sempre. Um comprador bem informado economiza muito dinheiro!